segunda-feira, 18 de agosto de 2014

O significado político das palavras


A Revista Época desta semana (Ed. 846, 18/08/2014, p.7) traz uma crônica interessante de Eugênio Bucci a respeito da insistência da Presidente Dilma em ser chamada de PresidentA. Pode até ter um quê de feminismo, mas na realidade funciona como um identificador de preferência eleitoral. Quem a chama de PresidentA está dizendo que é adepto dela e agora, nesta época, eleitor.  Quem a chama de Presidente faz uma espécie declaração de voto. Ou está de acordo com a sua gestão. Quem a chama de PresidentE mostra que é da oposição e não está de acordo com a sua gestão.

Costumamos, na língua portuguesa, classificarmos, coisas, cargos, etc., segundo o gênero. A Presidência da República é um cargo e se formos ao dicionário e procurarmos o verbete cargo, encontramos que é um substantivo masculino. Uma querida amiga recebeu uma comenda e colocou no seu cartão a referência “comendatriz”. Lembrei a ela que era comendadora, pois esta é a esposa do comendador. É o caso da embaixatriz e da senatriz, esposas, respectivamente, do embaixador e do senador. Hoje temos a embaixadora e a senadora. Houve discussões semânticas quando foram nomeadas as primeiras embaixadoras e foram eleitas as primeiras senadoras.

Quando foi criada a Fundação José Saramago, o escritor recomentou a sua esposa Pilar Del Rio, como presidentA[1] da Fundação. Mais adiante Pilar é entrevistada e o entrevistador refere-se a ela como presidentE. Ela corrige: presidenta. Dada a insistência do jornalista Pilar reafirma que ela sendo mulher é presidenta e se até então só havia presidentes é porque não havia mulheres ocupando esta função[2], lembrado por Eugênio Bucci, citado acima.

No caso brasileiro, Dilma foi a primeira mulher a ocupar o cargo de Presidente da República, portanto ela é a Presidenta. E está no direito em exigir que assim seja chamada. Ela não é mulher? A discussão saiu do campo da semântica para o campo da política. Os que querem agradá-la chamam-na de Presidenta e os opositores chamam-na de Presidente.

Bucci nos lembra de outros termos que identificam posicionamentos políticos contra ou a favor. Se nos referirmos às ilhas Falklands estaremos reconhecendo a soberania inglesa, mas se nos referimos às ilhas Malvinas o nosso posicionamento será a favor da Argentina. Da mesma forma, seremos favoráveis ao MST se nos referirmos aos atos de ocupação e contrários se consideramos invasão. O mesmo acontece quando nos referimos à Revolução de 1964 e ao Golpe de 1964.

Agora estamos num período eleitoral. Até o dia 13 de agosto eram uma candidata e dois candidatos principais. Depois do fatídico acidente em que pereceu um dos candidatos que estava entre os três de maiores intenções de votos e considerando as negociações iniciais, poderemos imaginar que em janeiro de 2015 poderemos ter um presidente, ou uma presidenta ou uma represidenta. Esta ordem também denuncia um desejo político.

Mauro Cherobim













[1]  José & Pilar – O filme. 48 minutos. https://www.youtube.com/watch?v=iesonOSVTBQ
[2]  Id. 1h, 34 min, 31 seg. do filme citado acima.

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