sábado, 14 de outubro de 2017

Ser professor

Apesar de ser filho de professora e irmão de três professoras, nunca pensei em se professor. Eu era radiotelegrafista numa estação no interior onde fazia escala o avião do CAN (Correio Aéreo Nacional). Eu tinha 22 anos. Entre os passageiros de um voo do CAN  havia um que diferenciava-se dos demais passageiros, quase todos com características de caboclos do Brasil Central:  alto, loiro, cabelo curtinho e falava inglês. Perguntei a um dos sargentos da tripulação “quem é este cara aí?”. É um antropólogo, respondeu. E o que ele faz? quis saber. Ele vai numa tribo do Xingu, faz perguntas para os índios, anota, volta para o país dele e escreve um livro, respondeu o sargento.
Encasquetei: vou estudar antropologia. Lá do interior de Mato Grosso transferiram-me para Curitiba e fui fazer o 3º ano do colegial e procurei saber onde eu poderia estudar antropologia. Fiz vestibular, fui aprovado no curso de História Natural. Tinha aulas de botânica, petrografia, biologia e nada de me ensinarem conversar com índios, anotar e escrever livros. Fui descobrir que o que ensinavam era antropologia física no segundo ano. Mas poderia escarafunchar os sambaquis do litoral do Paraná. Fiquei em Curitiba nos anos de 1961 até 1966. Período difícil. Parei com o curso de História Natural até que soube de um  curso de Sociologia, Política e Administração Públicas ligado a agora Universidade Católica do Paraná. Como a situação política em Curitiba não estava muito favorável para mim resolvi retornar a São Paulo e terminei o meu curso da Sociologia e Politica de São Paulo e em segui fui fazer o meu pós da USP. Foi quando começavam a surgir as primeiras faculdades particulares. Tive um colega de curso, tornamo-nos amigos e ele me convidou para lecionar em Mogi da Cruzes. Foi uma beleza! Primeiro financeiramente. Segundo por começar a aprender a ser professor. E a fazer pesquisa entre os índios guarani do litoral. Aproxima-se a meio a século o dia que entrei pela primeira vez numa sala de aula, como professor e de antropologia.  Em março passado fez 47 anos.
Quantos alunos passaram por mim? Não tenho a mínima ideia.  Tive turmas com 150, 200 alunos. Parecia mais um conferencista do que um professor. Passei por situação difíceis, como por duas vezes sentei no braço de  carteiras e elas vieram. Levei tombo com plateia. Certa vez fui fazer uma palestra no fórum de uma cidade do interior e a plateia olhava de maneira esquisita para mim. Olhei para a minha roupa e estava tudo certo, não aparecia nada que não deveria aparecer. Perguntei o que estava acontecendo e me falaram  que o gradil que separava a plateia do fórum ao local onde ficava o juiz poderia cair. Eu estava encostado nela. O melhor momento que passei neste aprendizado de ser professor foi no Amazonas, com relação à distância social. Em outras palavras, não existe distância social do professor em relação aos diferentes estratos sociais.
No decorrer da nossa vida profissional passamos por dissabores, com a diversidade de alunos de péssima formação, mas presos por modelos políticos, religiosos, etc. Hoje, fora da atividade docente e com as redes sociais, é comum alunos comentarem a respeito de alguma orientação, alguma resposta, despercebida para nós, mas crucial para os alunos. E ficamos felizes quando encontramos de graduação que hoje são doutores, pós-doutores.
A responsabilidade do professor é medida em longo prazo. É uma profissão de vida com resultados conhecidos quando não haverá mais meios de corrigir erros.
Eu me tornei professor por acaso, mas me orgulho por esta profissão que exerci por quase meio século.
Um abraço aos meus colegas de profissão.

Mauro Cherobim (15/10/2017)

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